POR TRÁS DAS CORTINAS




Cláudio Lira

Nascido em Petrolina, no sertão de Pernambuco, Cláudio Lira veio jovem ao Recife estudar, graduando-se em Programação Visual na Universidade Federal de Pernambuco. Na capital, se encontrou com uma paixão: o teatro, e foi aproximando-se primeiro como ator, depois como assistente de direção até se tornar diretor. Hoje Cláudio acumula 16 anos de vivência cênica e durante esse tempo continuou aprimorando sua expressão gráfica.



Você iniciou sua trajetória nas artes cênicas depois de se formar em Programação Visual. Já havia, antes disso, um envolvimento com o teatro? Quando ele começa?
Na verdade sempre houve dentro de mim uma relação muito forte com o fazer teatral, mesmo quando eu não tinha a consciência disso. Desde criança, no interior do Estado, eu inventava meus teatrinhos, juntava meus primos e amigos da rua e montava o que eu chamava de “Draminha”, em que eu escolhia o texto, improvisava o cenário e o figurino, dirigia o elenco e também atuava. Tudo isso acontecia na garagem do meu avô. Eu adorava também participar das peças que a escola promovia. Sempre cultivei um desejo muito grande de fazer teatro, que só depois de muito tempo eu pude realizar. Eu vim morar no Recife para terminar meus estudos, fazer o segundo grau, e depois entrei na Federal no curso de Programação Visual. O primeiro curso de teatro que fiz foi o da Arte Viva, e era ministrado por Valdi Coutinho e Ricardo Mourão. Eu fiz esse curso quando estava na faculdade, já tinha certa independência da família e tive coragem de fazer teatro. Em 1992, no final do meu curso de graduação, eu desenvolvi uma monografia de conclusão do bacharelado estudando o trabalho do cenógrafo Beto Diniz. Eu tentei relacionar a cenografia com a programação visual na sua criação. Na verdade foi uma forma de, através do meu curso, me aproximar mais do teatro. Foi então que conheci Antônio Cadengue, que foi o meu co-orientador nessa monografia, e assim eu pude fazer uma incursão mais profunda na história do teatro do nosso Estado. Eu entrevistei grandes personagens do nosso teatro como Milton Baccarelli, Fernando Augusto, Bóris Trindade, José Mário Austregésilo, João Denys, entre outros. Esse meu descobrir do universo do teatro foi mágico e me fez ver claramente que não havia mais razão para adiar o meu encontro mais íntimo com essa arte. Isso eu devo muito a Cadengue, que é muito generoso ao ensinar a quem ele sente que está ávido em aprender. Percebendo minha inclinação para direção, ele me convida para acompanhar como ouvinte e aprendiz no processo de encenação do espetáculo O Alienista. Durante o processo de ensaios, o ator Paulo de Pontes teve que viajar para o sul do país com o espetáculo Cinderela, e Ednaldo Ribeiro, que estava no elenco, o substituiu. Então eu, que estava mais à mão e conhecia bem o espetáculo, entrei fazendo os personagens de Ednaldo. Foi assim meio de supetão que estreei como ator numa companhia profissional, e a partir daí fiz alguns trabalhos como ator e mais tarde como assistente de direção.

2 - Seu trabalho de diretor de arte influencia seu trabalho como ator ou diretor?
Sem dúvida, essa visão estética que eu comecei a aprimorar com o meu trabalho de diretor de arte claramente se espelha no meu trabalho de diretor teatral, pois me permite ter uma visão mais ampla da estética da cena, fazendo com que o aspecto formal seja bem claro no meu trabalho. Eu tento equilibrar a luz com o cenário, com o figurino, etc. Sempre penso nas cores, nas texturas e como elas podem ressaltar a intenção ou a tensão que quero imprimir à cena. Gosto do belo em cena, do equilíbrio dos elementos e da sua funcionalidade. Uma coisa que herdei, não só da direção de arte, mas também de Antônio Cadengue, é a preocupação com os detalhes. Como ator, também herdei um pouco dessa influência formal, procurando intenções não só no psicológico dos personagens, mas também no universo estético que o cerca e suas possibilidades.

3 - O que faz o encantamento inicial pelo teatro persistir após tantos anos trabalhando com essa arte e quais os maiores desafios enfrentados para viabilizar as peças?
Esse encantamento persiste sobre tudo pelo desejo de uma realização pessoal. É essa paixão pelo teatro que me move, não consigo viver sem isso. A cabeça não para de criar e, quando acaba um processo de trabalho, outras ideias logo surgem, em alguns casos até durante, e eu tenho que guardar no fichário da memória para ser utilizado mais adiante. No fundo quem faz teatro neste Estado é sobretudo um apaixonado muito teimoso, pois são muitas as adversidades impostas para conseguirmos produzir alguma coisa. Para você viabilizar uma peça está cada vez mais complexo, o nível de exigência dos editais são cada vez mais difíceis de cumprir, a burocracia só aumenta. Às vezes dá a impressão de que a qualidade da proposta de encenação e o nível dos artistas envolvidos no projeto não contam mais que os detalhes burocráticos impostos pelos editais a cada ano. A arte não combina com burocracia. Números e estatísticas também não, acho que acabamos ficando reféns desses editais, e na verdade se perdeu um pouco a coisa do produtor que ia buscar apoio diretamente nas lojas e empresas, como se fazia antigamente. É muito complicado fazer arte nesse país e nesse Estado nem se fala. Isso tudo às vezes dá um desestímulo, mais é superado quando algo que fizemos com tanto suor dá um bom resultado e um retorno positivo do público, pois é disso que nos alimentamos.

4 - Seu início no teatro se deu primeiro como ator e depois evoluiu para a direção. Ser diretor parece uma opção definitiva ou ainda há espaço para a atuação?
Aqui não tem um curso específico para direção teatral, ou para qualquer outra área mais técnica, como cenografia e iluminação, por exemplo, e os interessados por isso são poucos. Há apenas cursos de interpretação e, se queremos nos aprofundar mais sobre o universo do teatro, temos que fazer esses cursos. Os poucos que desenvolveram esse lado mais técnico, aqui no Estado, se vêem sobrecarregados com a demanda de projetos, falta gente nova com talento no mercado. Aqui em Pernambuco, as pessoas interessadas em direção têm mesmo é que correr atrás, e quem não pode sair daqui tem que buscar de outras formas esse aprendizado. Foi o que fiz quando entrei no curso de Formação de ator da Fundação Joaquim Nabuco, que era muito bom e não tem mais. Na verdade o fato de me tornar diretor foi uma inclinação, mas eu gostaria muito de voltar a atuar. Eu já pensei até em chamar um diretor para me dirigir, mas sempre aparece um novo projeto e vou deixando isso de lado, mas eu vou voltar a atuar sim, ainda não sei quando, mas estou aberto a propostas.

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